quinta-feira, outubro 16

Corredor verde e corredor no verde

Artigo publicado no Jornal Setubalense em 19.03. 2014

A procura da harmonização do espaço humanizado com o natural tem sido uma constante ao longo da história, mas a sua necessidade sentiu-se de forma mais premente quando o fenómeno urbano se expandiu, em particular a partir da revolução industrial. Foi aí que se começou a introduzir de forma mais sistemática a natureza na cidade como tentativa de restabelecer esse vínculo perdido. Não é por acaso que é justamente com o século XIX que os parques, os jardins e a vegetação nas ruas e avenidas se tornaram tão importantes.
Mais recentemente reconheceu-se a necessidade de estabelecer contínuos naturais que permitissem o fluir da fauna, flora, vento e água naquilo que se determinou como estrutura verde (ou ecológica). O “corredor verde” mais não é que um espaço urbano que permite a permanência ou a mobilidade, em contínuo, dos elementos naturais, assim como aos habitantes da cidade participarem e usufruírem destes. Tentou-se acabar com a separação tradicional entre a cidade e o campo, passando este último a integrar o primeiro.
Com o abandono do mundo rural (e florestal) novos desafios se colocam, mas agora de sentido contrário. É agora a cidade, através dos habitantes que maioritariamente aí vivem, que tem de se deslocar até ao campo, para que este produza e se preserve. Para isso as acessibilidades adequadas são importantes para permitirem a mobilidade entre espaços urbanos e rurais com fluidez para benefício mútuo.  
Faz todo o sentido criar “corredores no verde” que se articulem com os “corredores verdes” para circular entre estes dois mundos de forma ordenada. As suas fronteiras estão cada vez mais esbatidas, quer por força da mobilidade residencial e laboral crescente quer pelo aumento exponencial do tempo que se dedica ao lazer (cultura, desporto e turismo) e que os faz aproximar ainda mais.
À cidade de Setúbal que está entre duas reservas (Arrábida e Sado)- de alto valor, agrícola, ecológico, paisagístico e mesmo patrimonial - uma boa articulação entre estes dois mundos interessa muito. Curiosamente parece, hoje, ser mais difícil ordenar o espaço natural que o espaço urbanizado, tornando-o ainda mais fechado.
Seja por desleixo, abandono, excesso de burocracia ou mau planeamento, ineficácia, fundamentalismo ambiental ou uso errado do direito de propriedade, o espaço natural tornou-se mais inacessível. Só dificilmente se consegue sair do asfalto para percorrer caminhos devidamente identificados, cartografados e autorizados. Fora as poucas pessoas que os conhecem, todas as outras correm o risco de se perderem ou de involuntariamente invadirem propriedade alheia.

Sugerimos pois que se institucionalizem estruturas de decisão com os diversos agentes (incluindo proprietários) que permitam ordenar, marcar e proteger caminhos públicos que criem os referidos “corredores no verde” que proporcionem o usufruto da Serra e do Estuário por parte dos caminheiros, desportistas, amantes da natureza e turistas.

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